Não há uma versão oficial de como aconteceu o Jailbreak do PlayStation 3. No fim de agosto conseguiram uma brecha no sistema, que até então era à prova de pirataria. Desde então, hackers do mundo inteiro estão aperfeiçoando o método para jogar ilegalmente no console.
Uma das principais versões da história é a de que tudo começou com um
firmware que o hacker George Hotz teria criado. Ele ficou famoso nos Estados Unidos por seu trabalho ao destravar o iPhone e, em 2009, anunciou que iria trabalhar para destravar o console da Sony. Aparentemente o hacker teria conseguido burlar a segurança da versão 3.41 do PS3, mas, em julho desse ano, declarou em seu Twitter que não iria divulgar o seu firmware e iria parar de tentar destravar o console da Sony.
Algum tempo depois vazaram documentos importantes da Sony que revelavam códigos e scripts da versão Debug do console. Outra relato informa, que, na verdade, o que aconteceu é que um pen drive usado pelos técnicos da Sony para fazer a manutenção de consoles quebrados caiu nas mãos erradas e foi copiado. O suposto pen drive tem a função de copiar todas as informações da memória para fazer a manutenção do aparelho.
A primeira versão do Jailbreak foi uma combinação desses dados que vazaram da Sony com o firmware criado por GeoHot. A partir daí outros hackers começaram a fazer a engenharia reversa do sistema.
Sites do mundo todo começaram a vender o equipamento que roda jogos sem você precisar comprá-los por cerca de U$140, e já é possível fazer a pré compra em sites brasileiros pelo valor de R$300,00. Cada jogo possui, em média, o tamanho de 25GB.
Para quem tem um pouco de experiência com programação já é possível destravar o PlayStation 3 de casa, repetindo as linhas de programação que foram divulgadas na Internet. Alguns sites vendem a placa de circuito para montar o pen drive especial em casa. Vale ressaltar que todo o processo ainda é muito primitivo.
Por enquanto o sistema só funciona no firmware 3.41 e a Sony já lançou a atualização do 3.42 (no dia 7 de setembro), que trava a funcionalidade do PSJailbreak, PSFreedom e do PSGroove.
O PSGroove é uma variação do Jailbreak. Ele é Open Source, não visa obter lucros, e pode ser baixado em qualquer kit de desenvolvimento USB, o que não obriga o jogador a comprar o pen drive, caso ele já tenha algum outro dispositivo compatível.
Esse sistema funciona de forma semelhante com o que é feito no Wii. Ele permite a instalação de programas ilegais não certificados pela Sony, o que gera a possibilidade da produção de Homebrew.
O PSFreedom surgiu mais recentemente e permite o desbloqueio do console da Sony através de alguns modelos de smartphones que funcionam com Linux. Quem desenvolveu esse jailbreak foi o hacker KaKaRoTo que explica em seu blog que é necessário ter o firmware 3.41 do PS3 para que o hack dê certo. O PS3Freedom funciona de forma semelhante ao PSGroove.
O blog oficial da Sony informa que a nova atualização traz medidas de segurança, mas não especifica quais. O blog europeu da Sony traz um pouco mais de detalhes, informando que a atualização tem 168MB e visa cobrir algumas falhas de segurança do console.
O que é, e como funciona?
O PS Jailbreak é um plug USB que é instalado em segundos sem mexer na integridade do seu console. Ele é compatível tanto com os modelos FAT quanto Slim e roda nos consoles americanos, japoneses, europeus e coreanos.
Originalmente o firmware foi feito para rodar na versão 3.41, mas ele funciona em versões mais antigas também. Só é possível rodar jogos de PlayStation 3 através dele. Não é possível colocar jogos de PlayStation 2 ou filmes Blu-Ray.
Segundo os sites que vendem os acessórios, até hoje foram testados 150 títulos e todos funcionaram com o Jailbreak. Os jogadores ainda podem jogar online com o aparato, mas não há garantias de que os mesmos não serão banidos no futuro.
A Brecha
Com o lançamento do PSJailbreak, não demorou para que similares aparecessem pela rede. Tudo por causa do PSGroove, uma versão Open Source do aparelho, que dá explicações para qualquer um destravar seu console.
O destravamento acontece por uma brecha de segurança, realizada graças a um excesso de dados passados através da alocação de memória dinâmica. Segundo análises de sites especializados no assunto, o que o Jailbreak faz é simular um hub de seis portas USB e uma situação de colocar e tirar esses falsos pen drives.
Com esse falso hub, o aparelho é forçado a liberar blocos de memórias que posteriormente, serão preenchidos com os dados necessários para as devidas modificações na programação. O processo é detalhado minunciosamente em sua versão Open Source, com as devidas funções de cada porta USB, mas que de nada adiantam àqueles que não se familiarizam com a linguagem.
'Tiago', programador, suspeita que esse exploit (termo técnico para a brecha de sistema) aconteceu depois que os PS3 tornaram-se compatíveis à instalação do Linux. "Não é um recurso exatamente corriqueiro para o usuário 'normal'", conta. "Se fosse um sistema mais fechado, dedicado aos desenvolvedores que pagam para produzir pra ele, aí a conversa seria mais complicada", finaliza o especialista.
Nas ruas de São Paulo
No dia 31 de agosto, a equipe do GameTV passou pelo centro de São Paulo para uma inspeção nas lojas de eletrônicos do bairro, famosas por seus artigos ilícitos. Fazia pouco mais de uma semana que o console havia sido hackeado - com direito a vídeos na internet e tudo mais - e as ruas estavam caladas.
Uma visita rápida em lojas conhecidas por seus produtos "politicamente incorretos" não revelava tom algum de entusiasmo. "Ah, saiu, mas já impediram a pirataria", dizia um dos vendedores - suas verdadeiras identidades serão mantidas em sigilo a pedido dos mesmos. "Olha, meu fornecedor não me disse nada a respeito. Talvez nem chegue por aqui", dizia outro. "Funciona mesmo isso?", indagava-se um transeunte curioso. A falta de informações concretas era uma constante.
'Diego', vendedor há dois anos em uma loja de produtos eletrônicos da Sta. Ifigênia, diz não ter se empolgado muito com a ideia de hackear seu console. "Vão fazer que nem fizeram com os X360 destravados: banir todo mundo. E eu gosto de jogar online", conta. O lojista também achou o sistema de "destravamento" um pouco complicado, enfatizando que seus clientes não são lá exímios operadores de eletrônicos e softwares.
"Nego (sic) chega aqui querendo videogame destravado, daí você fala qualquer coisa a respeito de firmware e eles já começam a ver com desvantagem o destravamento", explica o vendedor. Ele acha que inserir um pen drive no console, instalar um software e depois pegar o jogo do HD externo uma tarefa exaustiva para a maioria dos jogadores casuais (e alguns "boyzinhos", como ele os chama).
'Fábio', gerente de uma loja de games no centro da cidade, diz que não vai revender o produto. "Estoquei um acervo relativamente grande de originais para o PS3. Não gostaria de vê-los encalhados na minha loja", revela. É mais ou menos o que a maioria dos lojistas pensa a respeito. "Não foi como o X360, que recebeu pirataria logo de cara. Com o PS3 eu não esperava que isso fosse acontecer", justifica.
O que pensam os especialistas
Jornalistas ligados à indústria brasileira de games tem uma opinião comum a respeito do Jailbreak. O sentimento otimista perdura com a ideia de que o PlayStation 3 não vai sucumbir à pirataria, assim como seus antepassados.
Bruno Vasone, editor do Arena Turbo
"Como ferramenta que possibilita o desenvolvimento "caseiro" de jogos e aplicativos, o destravamento abre as portas do PS3 para o desenvolvedores independentes, prejudicando apenas a Sony e seu sistema de sanções e royalties sobre todo o conteúdo produzido para o PS3. Já como backup de jogos e, consequentemente, pirataria, é difícil imaginar um mercado negro baseado na venda de HD's contendo cópias de jogos. Talvez pendrives "baratex"? Mas se os piratas encontrarem uma maneira, isso pode afetar profundamente o mercado brasileiro, e sua recente ascensão, que depende muito da venda de jogos originais pra PS3. As empresas então terão que forçar a diminuição do preço de seus produtos no Brasil como se não houvesse amanhã, ou morrer na praia. E, se isso acontecer, todos perdem".
Caio Corraini, do Arena Turbo
"Ainda é tudo complicado e eu não vejo ninguém gastando mil reais num console, sendo que nem sabe se vai conseguir usar ele com os piratas. 360 tá aí, muito mais "simples", portanto não faria muito sentido. Mas acredito que, talvez, algumas das pessoas que "já tenham" o console é que vão acabar embarcando nessa. Torço para que não vá longe...".
Claudio Prandoni, do UOL Jogos
"Pela maneira como o processo é feito atualmente, acho que deve aparecer um público que vai adotar de vez o método e só usar jogos ilegais no PS3. Porém, acho que deve acontecer algo parecido com o que rolou com o GameCube: é tão complicado rodar jogos piratas no PS3 que muita gente vai preferir usar os originais mesmo. Ou seja, duvido muito que a pirataria no PS3 se popularize tanto como aconteceu com o PlayStation 2".
Fábio Santana, editor da revista Edge Brasil
"E recomeça a corrida de gato e rato. Hackers exploram brechas, Sony atualiza firmware, hackers investigam sistema em busca de outras aberturas... Para uma parcela da população que aprendeu no PS3 o sentido de se comprar um punhado de jogos originais, será difícil voltar à pirataria. Para muitos ainda, no entanto, imagino que seja uma possibilidade tentadora. Por esses é que a Sony está se cercando de todas as precauções, legais e tecnológicas. Particularmente, acredito que o impacto será menor: os arquivos são gigantes para baixar, não há mídia gravável acessível e sempre há o fator inibidor de um banimento da rede. Mas qualquer impacto é preocupante, e a Sony tem que fazer valer o seu know-how em blindagem de sistema - e o consumidor, mudar a sua cultura de consumo".
Gustavo Petró, do G1
"Acho que ainda vai levar um tempo para saber se a piratara no PS3 vai pegar. Os jogos são muito grandes para serem baixados e ainda mais armazenado em HDs. Inicialmente, os "pirateiros" vão ter muito trabalho para poder ter os games de graça mas, acho que com o passar do tempo, se esse esquema de "desbloqueio" der certo, ele se tornará tão popular quanto foi a pirataria no PS2. Resta saber se a Sony vai conseguir bloquear consoles que rodam games piratas em partidas on-line".
Humberto Martinez, redator-chefe da D&T PlayStation e Gameblog
"O PS3 bloqueado reeducou o público e lembrou a todos o valor de ter jogos originais. Ouço o tempo todo comentários sobre como é mais gostoso ter alguns poucos (e bons) jogos originais do que um case cheio de piratas que acabam não sendo jogados. Acho que essa nova visão dos jogadores, mais do que o combate intensivo da Sony via atualizações de firmware, é o que impedirá que a pirataria do Play 3 prolifere como a do PS2".
Pablo Miyazawa, do GamerBR e editor da Rolling Stone
"Eu particularmente fiquei chateado com o jailbreak do PS3. Apesar de muito aguardada, a "quebra" da segurança do console não deve ser comemorada por quem quer ver o mercado brasileiro de games seguindo um caminho de evolução. Passamos por toda uma geração liderada pelo PlayStation 2 com o "fantasma" da pirataria nos rondando, o que impediu que a Sony começasse a atuar oficialmente no Brasil. Agora com a pirataria sendo um risco novamente, é mais um fator para ser utilizado como desculpa pelas fabricantes para cobrar preços excessivos pelos produtos oficiais. A pirataria ajuda a alguns, mas atrapalha como um todo".
Breve histórico da pirataria no PlayStation
- O PlayStation foi lançado em 1995 nos Estados Unidos e vendeu mais de 100 milhões de unidades até 2006, quando parou de ser fabricado.
- O console não precisava ser destravado para rodar jogos piratas, mas em compensação não era qualquer um que conseguia baixar e queimar uma mídia para jogar em casa. Era mais complicado arranjar um jogo pirata caseiro naquela época.
- O PlayStation 2 foi lançado no dia 26 de outubro de 2000 nos Estados Unidos e já vendeu mais de 140 milhões de unidades até hoje.
- O PS2 é equipado com um sistema DRM (Digital Rights Management), que visa certificar que o aparelho está rodando somente DVDs originais da Sony. Porém é uma mídia extremamente fácil de ser corrompida.
- Um método para destravar o console é via software pelo SoftMod. O jogador precisa instalar no Memory Card um software que evite a checagem da mídia pirata no PS2.
- É possível destravar o console via hardware usando um ModChip. É necessário instalar o dispositivo dentro do videogame para que ele intercepte e bloqueie o sinal do DRM quando a mídia for ser checada.
- Um dos mais populares foi o Magic3. Logo em seguida foi lançado o Thunder Pro, uma versão brasileira do chip Morpheu (mais evoluído que o Magic3). A versão Thunder Pro Gold 2 permite aos jogadores gravarem jogos direto em pen drives, o que evita o desgaste do leitor óptico, que era a maior reclamação dos usuários da versão anterior do chip - que reclamavam que o console esquentava muito e o consumo de energia aumentava.
- Hoje, o chip Matrix Infinity é o único usado pelos pirateiros. Ele é a última versão dos chips e a maioria dos técnicos que trabalham com o destravamento de consoles o utilizam. O chip lê todos os tipos de CDs e DVDs. Além disso, sua atualização se faz via firmware gravada em mídia.
Medidas legais já foram tomadas pela Sony para evitar a comercialização do PSJailbreak. Na Austrália a importação do acessório foi proibida por uma lei judicial, e os comerciantes que tiverem a mercadoria em estoque deverão entregá-los a Sony. Quem fez a pré compra do dispositivo USB foi reembolsado.
A Sony Computer Entertainment America entrou com um processo contra uma loja online na Califórnia. Uma das principais acusações contra a Zoomba LDC é a de violação de direitos autorais, dado que o site estava realizando a venda do Jailbreak e é listado como um dos pontos de vendas oficiais do aparato.
Até agora a Sony Brasil não fez nenhuma declaração a respeito do PSJailbreak.